Os Açores esperaram, com paciência, pelo desfecho de um processo intrincado ao mais alto nível no Vaticano. Cerca de um ano depois, está feita a escolha. Temos bispo!
Será interessante verificar que temas o novo bispo tratará como prioritários, além das Jornadas Mundiais da Juventude, que estão mesmo à porta.
Não é desprovido de significado que D. Armando Domingues, enquanto bispo auxiliar do Porto e membro da Comissão Episcopal do Laicado e Família, tenha participado recentemente no X Encontro Mundial das Famílias. Trata-se de um evento fundado pelo Papa João Paulo II em 1994 e que acontece a cada três anos. O último teve lugar em Roma no passado mês de Junho.
Na ocasião, D. Armando Domingues lembrou que o sacramento do Matrimónio não é «um sacramento que se esgota» no dia da celebração, mas «uma vocação que é um caminho de santidade, um sacramento a viver todos os dias».
Poderemos esperar do novo Bispo de Angra uma atenção especial às famílias?
Na minha experiência como catequista, os assuntos mais delicados de abordar foram precisamente os que dizem respeito à família, entre os quais a definição de matrimónio e, sobretudo, para que serve.
(A ter em mente: se uma criança frequenta a catequese, tal implica que um familiar ou tutor legal a inscreveu, pressupondo-se existir a vontade de a educar nos valores cristãos.)
Como ensinar, a um filho de pais divorciados, que o matrimónio é um vínculo indissolúvel?
Como ensinar, a um filho de pais que se dão mal entre si, que o matrimónio existe para o bem dos cônjuges?
Por vezes sucede que o que o catecismo (católico) diz não bate certo com o que alguns pais (católicos) fazem. E agora?
O estado de vida dos pais deveria ser, mas na realidade não é, tantas vezes, conforme ao matrimónio nos termos em que é apresentado no Catecismo da Igreja Católica. Alguns pais vivem separados, alguns mesmo divorciados, outros tornaram a casar e há ainda aqueles que nunca chegaram a casar-se...
A educação cristã dos jovens não pode ignorar a realidade desta diversidade de estados que se verifica dentro da própria comunidade.
Antes de mais, porque a missão fundamental da catequese é promover o encontro com Deus. E esse encontro faz-se na realidade concreta de cada pessoa, nas suas circunstâncias actuais. «O pão nosso de cada dia dá-nos hoje».
Depois, pelo impacto da mensagem no destinatário.
Uma coisa é dizer a um homem e a uma mulher que conheço bem: «Hey! Não percebo porque não se querem casar. O matrimónio é um dos sacramentos da nova aliança de Deus com a humanidade, uma coisa lindíssima através da qual podes colaborar para a salvação da pessoa que amas».
É bem diferente de lançar à cara de uma criança: «Os teus pais não são casados pela Igreja. Logo, Deus não gosta, e por isso não podem comungar».
Nos anos 90, em entrevista para a Rádio Renascença, o P. Vasco Pinto de Magalhães,sj. já alertava para os riscos de uma pedagogia cristã muito agarrada à letra da Lei, «a urgir a perfeição», que pudesse levar certas pessoas a sentir-se «meio condenadas por uma Igreja que lhes pedia o impossível», com a consequência provável de abandonarem a prática religiosa.
Na mesma entrevista, o P. Vasco afirmava que «A Igreja não pode renunciar a apresentar o seu ideal de vida, que é um ideal de amor elevadíssimo e extremamente exigente. Mas tem que dar meios, tem que reconhecer a gradualidade para lá chegar, apoiar a purificação de intenções e ajudar a distinguir a diferente responsabilidade no sentir e no consentir, senão ficamos todos de fora.»
Por isso me parece tão repleta de significado a afirmação de D. Armando Domingues sobre o matrimónio ser «um sacramento a viver todos os dias». Evidencia a importância da espiritualidade no quotidiano, quer na dimensão pessoal quer na dimensão partilhada, e a realidade de um trabalho contínuo, inacabado.
Vivo com expectativa a chegada de um líder empenhado na santificação das famílias.
Sr. Bispo, seja bem-vindo aos Açores, estamos a contar consigo!
Mariana Magalhães
da Mota