No passado domingo, neste Correio dos Açores li, nas colunas da mui bem informada Maria Corisca, que lhe teriam dito ter aparecido nas redes sociais algumas críticas ao novo genérico do telejornal da RTP/Açores.
Isto porque, S. Miguel aparece no dito cujo maior do que realmente é, e que tinha um ponto vermelho na localização de Ponta Delgada, considerando a localização daquele ponto vermelho uma demonstração de centralismo regional.
Que me desculpem os meus hipotéticos leitores, mas a leitura de tal disparate, fez transbordar o meu copo de tolerância e, por isso mesmo, não posso calar-me.
Devo dizer que não tenho por hábito ler o que escrevem nas redes sociais. Simplesmente porque considero as ditas redes como um “vazadouro” de frustrações. Assim, se naquelas redes, alguém contestar o que aqui escrevo, fica a falar sozinho.
Mas … vamos ao que interessa.
Quer os açorianos das outras ilhas queiram, quer não queiram, foi sempre na ilha de S. Miguel que se iniciaram as lutas pelas autonomias que, agora, tal como então, todos estes Açores desfrutam. Mais! No passado até houve quem não quisesse essa autonomia, tendo a mesma sido imposta pelo governo central.
Por outras palavras, pode-se afirmar que sempre foi a ilha de S. Miguel a mais rebelde e a ilha mais insatisfeita, atendendo ao modo como era (continua sendo) tratada por Lisboa; só que, agora, têm a conivência dos integracionistas locais, que os há, cada vez em maior número.
Assim, esta ilha do Arcanjo apesar de ter mais de metade da população dos Açores no seu todo, tem sido relegada para último plano no que em matéria investimentos diz respeito. Isto acontece tanto nos de obrigação nacional, como nos de obrigação regional. Exemplos disso são os casos do radar meteorológico, do estabelecimento prisional, da incineradora, entre outros. Diria até que, se não fosse a iniciativa privada a investir nesta ilha, estaríamos muito pior!
Sou da opinião de que, desde que se satisfaçam as necessidades das outras ilhas, tanto as do grupo central como as do grupo ocidental, mas sem megalomanias, estamos de acordo. Agora, quando num qualquer investimento, se exige ser igual ao que existe em S. Miguel, sem levar em linha de conta a população que a benfeitoria irá servir, alegando motivos de coesão e autonomia para satisfazer caprichos, é querer passar um atestado de “burrice” a S. Miguel que não merece!
Sempre afirmei, e continuo a afirmar, que a autonomia que hoje, nos Açores todos, se desfruta, independentemente da sua amplitude que aumenta ou diminui ao logo dos tempos, se deve à manifestação de 6 de junho de 1975.
Também como é sabido, foram muito poucas (para não dizer nenhumas) as ilhas que, naquela altura, acompanharam S. Miguel na luta desigual travada contra o centralismo feroz do governo comunista que então “reinava” em Portugal.
Pergunto aos super convictos autonomistas que agora se atrevem a tecer tais considerações:- onde estavam então? Porque não apoiaram os “revoltosos” micaelenses, manifestando-se na rua, em apoio ao que se passava em Ponta Delgada.
Sei perfeitamente que, presentemente, muitos dos que hoje “botam faladura” sobre autonomia, talvez ainda nem tivessem nascido à data dos acontecimentos.
Eles falam de autonomia de acordo com aquilo que ouviram dizer, ou leram; muitas vezes versões distorcidas, escritas por uma comunicação social auto-intitulada de esquerda, mas com hábitos de direita, e desfasada do que realmente aconteceu em Junho de 1975 e meses seguintes até Setembro de 1976.
Foram tempos de incerteza. Vivia-se com o natural receio de se repetirem as selváticas prisões efectuadas a 35 Açorianos, (31 de S. Miguel e 4 da Terceira), executadas pela calada da noite, nos dias a seguir à grandiosa manifestação.
Falo assim, porque falo por mim. Não li, nem me disseram fosse o que fosse a este respeito. Eu estava lá. Eu fui um, dos muito poucos que iniciaram aquela grandiosa jornada de luta. Apesar de alguns dissabores que passei, não estou arrependido do que fiz. Não abdico de nada e, muito menos, da minha quota parte na construção de uns Açores melhores.
Se não fossem os manifestantes de então, os Açores, ainda hoje, continuariam a ser três distritos com a autonomia outorgada pelo Estado Novo.
Só acrescento que, para viver com uma autonomia de miséria como a actual, mais valia regressar aos três distritos.
Assim os micaelenses ficariam livres de epítetos que não merecem!
Por aqui me quedo!
Carlos Rezendes Cabral
P.S. Texto escrito pela antiga grafia.
6NOV2022