O concurso público lançado pela Câmara Municipal da Ribeira Grande para a obra de segunda fase da ligação entre a Maia e a Lombinha da Maria, no valor de 1.700 mil euros e um prazo de execução de um ano, ficou deserto, apurou o ‘Correio dos Açores’.
A obra foi considerada em Maio deste ano pelo Governo dos Açores “de interesse público” e o concurso foi lançado no mês de Junho. Passado o período de apresentação de propostas, o caderno de encargos foi consultado por algumas empresas mas nenhuma apresentou uma proposta até 1.700 mil euros.
Como consequência, a Assembleia Municipal da Ribeira Grande aprovou uma proposta da Câmara Municipal a lançar novo concurso público, agora pelo valor de dois milhões de euros, havendo pelo menos um concorrente interessado em executar a obra por este valor.
O Presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande, Alexandre Gaudêncio, disse ao ‘Correio dos Açores’ que, face a esta circunstância, e face aos ‘timings’ habituais nestes processos, as obras já não começam antes do próximo Natal, só devendo ter início em Janeiro de 2023.
Alexandre Gaudêncio tinha sido ouvido em Julho na Comissão Permanente de Política Geral da Assembleia Legislativa Regional em Julho deste ano, em resultado de uma petição que chama a atenção para os atrasos na obra e as suas implicações na economia da Maia. Nesta altura, estava a decorrer o processo do primeiro concurso e ainda não se conhecia o seu resultado.
Então, o autarca disse aos deputados que a obra em questão “é muito importante para o concelho da Ribeira Grande, em especial para a freguesia da Maia, por se tratar de um caminho municipal que carecia de uma intervenção profunda e por este apresentar alguma instabilidade”.
Alexandre Gaudêncio historiou que a Câmara Municipal solicitou, em 2015, um relatório ao Laboratório Regional de Engenheira Civil com o objectivo de serem identificados “os riscos inerentes em toda a sua vertente” da obra e, um ano depois, solicitou um estudo “aprofundado” à empresa Geotrota, Unipessoal, Lda., “especializada em geotecnia, para verificar as preocupações manifestadas pelos habitantes da freguesia e pela própria junta de freguesia da Maia” do perigo em que se encontrava o ramal entre a Maia e a Lombinha da Maia.
Pelos estudos realizados, quer pelo Laboratório Regional de Engenharia Civil, quer também pela empresa privada, “foi verificada a necessidade da realização de diversas drenagens, devido às inúmeras nascentes ali existentes, e também da estabilização de taludes em grande parte do percurso, recomendações que foram contempladas no projecto final da obra”.
O edil deixou claro – e nisso nunca foi desmentido - que “desde a primeira hora solicitou a opinião da Junta de Freguesia que fez chegar diversos contributos que foram sendo incluídos no projecto final, como a reabilitação da via e também a construção de um passeio pedonal em toda a sua extensão”.
Após todo o processo de análise do projecto e das alterações, a Câmara Municipal da Ribeira Grande colocou em concurso público a obra, distribuída em duas fases, uma primeira fase para a estabilização dos taludes e drenagens que, entretanto, já foi concluída, e uma segunda fase para a reabilitação da via e construção do passeio pedonal.
A primeira fase da obra foi lançada em Abril de 2020, com um prazo de execução de 270 dias e com um valor de 542 mil euros. No entanto, durante a execução do empreendimento, “decorreu uma derrocada inesperada que provocou atrasos na sua conclusão em cerca de 110 dias e com um valor adicional de 266 mil euros. Assim, a primeira fase da obra passou a custar 808 mil euros e o prazo de execução foi dilatado para 380 dias.
O facto é que, com o atraso para a conclusão da primeira fase da obra, “esta só foi entregue em Outubro de 2021”.
Entretanto, a Câmara Municipal da Ribeira Grande avançou com os trâmites normais e legais para a segunda fase da obra que inclui “a reabilitação da via e seu alargamento, a construção de um passeio pedonal e a construção de vala para recolha e suporte de água, tendo solicitado pareceres às entidades competentes, por se tratar de zonas de reserva ecológica e reserva agrícola”.
Foi esta obra que foi a concurso público por 1.700 mil euros e um prazo de execução de 365 dias e nenhum concorrente apresentou uma proposta de execução.
Durante o debate de Julho deste ano na Comissão de Política Geral do Parlamento açoriano, o deputado do PS, Carlos Silva, considerou este “um problema que se arrasta há vários anos e que tem criado diversos constrangimentos, desde logo pelo atraso verificado na execução da obra devido à derrocada ocorrida inesperadamente”.
Perante o facto de a derrocada ter provocado danos em uma moradia, o deputado quis saber como se encontra o processo e quis também informar-se sobre o prazo de execução da segunda fase do empreendimento.
Alexandre Gaudêncio esclareceu que, de facto, a derrocada afectou uma moradia em obras que tinham sido embargadas. O embargo não foi acatado pelo proprietário da casa e o processo está em Tribunal.
O edital realçou que, desde que tomou posse como presidente da Câmara Municipal, em 2013, “assumiu esta obra como uma prioridade, não apenas por questões de melhorar as acessibilidades dentro da freguesia de Maia, mas também pelo facto de esta trazer melhores condições de segurança outrora inexistentes”.
Todavia, “sempre acreditou que fosse um processo mais célere, mas que tendo em conta as vicissitudes de todo o procedimento e da obra, como a derrocada que ocorreu, fez com que a demora fosse superior”.
Alexandre Gaudêncio disse na Comissão que a abertura da via ao trânsito “foi articulada” com a junta de freguesia e com base no parecer e na monitorização minuciosa que o Laboratório Regional de Engenharia Civil está a realizar. Actualmente, o Laboratório Regional “acompanha e monitoriza todo o talude para que, em caso de ser detectada alguma anormalidade, a Câmara Municipal consiga tomar as devidas diligências rapidamente”.
O autarca aproveitou a oportunidade para esclarecer que “está consciente dos constrangimentos que uma obra desta dimensão acarreta a uma freguesia e à sua dinâmica social e económica, mas que não se pode usar a obra como desculpa para o fechado de alguns serviços, nomeadamente o encerramento de algumas instituições bancárias”.
Relembrou, a propósito que nos últimos três anos a freguesia da Maia “aumentou, significativamente, o número de alojamentos locais; aumentou o número de moradias licenciadas e que, muito recentemente foi fechado um dos maiores investimentos turísticos do concelho da Ribeira Grande”.
Em Julho, o deputado socialista Carlos Silva questionou a Câmara da Ribeira Grande na Comissão de Política Geral se “estaria preparada com um plano alternativo para o caso de o concurso ficar sem candidatos, tal como tem acontecido com outras obras camarárias e governamentais”. Em resposta, Alexandre Gaudêncio afirmou que o município “está preparado para avançar com outra análise de mercado caso o concurso fique sem candidatos e encontrar uma solução rápida para iniciar a obra o mais depressa possível”.
Na petição, apreciada em Comissão Parlamentar, os mais de 300 peticionários consideravam já então que “a obra decorre há demasiado tempo, o que tem trazido diversos constrangimentos à população, em geral, mas em particular aos comerciantes da freguesia e que deve ser encontrada uma solução para terminar a mesma o mais breve possível”.
Perante os atrasos verificados, a população da Maia “sente-se indignada e prejudicada”.
“Como moradores e não moradores, sentimos que a Maia caiu no esquecimento, situação inadmissível em pleno século XXI,” conclui-se na petição.
A Maia é uma freguesia do concelho da Ribeira Grande com cerca de 1.800 habitantes, reconhecida em vários cantos do mundo, em parte devido aos grandes investimentos feitos nos últimos anos, pelo Governo regional, mas tem vindo a perder população, à semelhança de muitas outras.
“Aqui está uma boa oportunidade para combater a desertificação da Maia: não deixar que lhe seja roubado esse acesso por muito mais tempo!,” termina a petição.
João Paz