A empresa pública Portos dos Açores lançou um concurso público, publicado Quarta-feira no Diário da República, para a recuperação de uma locomotiva do Século XIX no porto de Ponta Delgada pelo preço base de 140 mil euros.
Esta locomotiva a vapor de origem inglesa, denominada “The Falcon Engine Car Works”, esteve no início do século XX ao serviço no incremento do molhe do porto de Ponta Delgada e está, actualmente, armazenada nas instalações oficinais do porto de Ponta Delgada, estando parcialmente desmontada.
A outra locomotiva, designada ‘Black Howtorn” esteve ao serviço da pedreira no local do actual aeroporto, transportando a pedra que serviu para o aumento do porto de Ponta Delgada e para a construção da Avenida Infante D. Henrique.
A pretensão de possuir um porto de abrigo em São Miguel já vinha de séculos atrás e materializou-se, com o grande empenho de empresários micaelenses, em Setembro de 1861 com o lançamento da primeira pedra, faz precisamente agora 159 anos.
No projecto desta obra esteve, então, como responsável o engenheiro inglês John Rennie que, em escritos da época, era considerado o “messias” daquele tempo. O porto viria a ficar concluído em 1943.
Relatos históricos apontam que tenham sido transferidas para os Açores um total de 5 locomotivas, das quais apenas as duas unidades se conseguiram preservar até à data. As duas locomotivas trabalharam nos sucessivos aumentos do porto até 1943 bem como o na sua manutenção, durante este período, devido às intempéries.
As duas locomotivas apoiaram ainda, durante a década de 50 do século XX, na construção da Avenida Marginal de Ponta Delgada.
Segundo um escrito do engenheiro Américo Correia para a Portos dos Açores, o abandono a que estiveram sujeitas as duas locomotivas ao longo dos tempos levou a que interesses ingleses as tentassem adquirir através do Mueseu de Londres ‘Science Museum’ que, entre 1975 e 1977, propôs a compra de, pelo menos, uma das locomotivas.
Durante a década de 70, e mesmo depois do interesse museológico dos ingleses, não foi tomada qualquer decisão e as duas máquinas ficaram inoperacionais, largadas num parque aberto, junto ao porto “onde aparentemente se reunia material marítimo obsoleto e sucata diversa”.
Até que o fotógrafo inglês Collin Aarratt as encontra no Outono de 1981. Como então escreveu, as duas locomotivas estavam “praticamente submersas em sucata e as suas formas enferrujadas pareciam emergir como fantasmas no meio do cais”.
A denúncia do fotógrafo inglês levou a que as duas locomotivas fossem desobstruídas e removidas do meio de toda a sucata que as envolvia.
Já em 1982 foi estabelecido um protocolo de transferência das duas locomotivas para a exposição e preservação no Museu Carlos Machado, em Ponta Delgada.
No período entre 1982-2001, os responsáveis do Museu Carlos Machado encetam várias acções para a conservação e preservação das locomotivas. Desenvolveram contactos com responsáveis da CP (Caminhos de Ferro de Portugal); contactos com a Universidade de Brunel; e contactos com a British Engineerium.
Então, a ideia de que as duas locomotivas, devidamente recuperadas, se tornariam num bem importantíssimo a acrescentar à oferta turística na Região começa a cimentar-se.
Ainda segundo o engenheiro Américo Correia, em 1986, a Secretaria Regional da Cultura requisita o serviço de recuperação das locomotivas por parte da firma ‘Antero de Paiva’, que trabalhava na área da metalomecânica. Todavia, “dificuldades financeiras fizeram com que neste mesmo ano de 1986 os trabalhos parassem, que se tivesse feito qualquer pagamento.
Na altura, a locomotiva, agora a concurso, designada “Falcon Engine Car Works” foi deixada parcialmente desmontada, sem que qualquer peça tenha sido tratada, “com a agravante de extravios e danos de componentes”.
Aparentemente, segundo o contactado na época, “os únicos danos terão sido a chaminé partida e um dos batentes do chassis de que não se conhece o paradeiro”.
Sem meios financeiros para realizar a recuperação das locomotivas, o Museu Carlos Machado acorda com a Secretaria da Habitação e Obras Públicas o seu depósito nas instalações do departamento governamental.
Em 2001, o então Director da Junta Autónoma do Porto de Ponta Delgada, Rego Costa, assinou com o Director do Museu Carlos Machado um protocolo o retorno das locomotivas à casa-mãe, para que fossem colocadas em espaço abrigo e fechado, onde actualmente se encontram.
Surgiram, depois, algumas tentativas para a recuperação das locomotivas, inclusive, com apoios comunitários, mas todos os esforços esbarrarem em questões burocráticas.
Mais recentemente, foi dado um passo importante para a recuperação da locomotiva “The Falcon Engine Car Works”. Este novo esforço iniciou-se com um requerimento do PPM, um dos partidos que fazem parte do Governo de coligação, a incentivar a recuperação das locomotivas com fins turísticos.
Este Governo manifestou em 2021 a intenção de celebrar um contrato-programa com a empresa Portos dos Açores, para a reabilitação de duas locomotivas e a criação de um museu nas antigas oficinas do porto artificial de Ponta Delgada.
Considerou, a propósito que, “tão importante como a recuperação daquelas duas locomotivas, é importante reabilitar o próprio espaço que as alberga, espaço este que correspondente às antigas oficinas do porto artificial e que actualmente não está afecto a qualquer uso”.
Em toda esta evolução, o concurso público agora lançado pela empresa pública Portos dos Açores é uma nova tentativa para recuperação de uma das locomotivas, a “The Falcon Engine Car Works” que, todos aguardam, deste vez, “chegue a bom porto”, com o aparecimento de interessados e com a sua recuperação com fins museológicos.