Dado o seu interesse pelas áreas da saúde e do desporto em simultâneo, Luís Duarte acabaria por, na altura de escolher um curso do Ensino Superior, optar pela área da Fisioterapia, saindo de São Miguel, onde nasceu, para estudar na Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa, em Lisboa.
Hoje, depois de uma licenciatura, duas pós-graduações e um mestrado, Luís Duarte é fisioterapeuta em vários locais, nomeadamente na Santa Casa da Misericórdia de Santo António da Lagoa – tanto na sua estrutura residencial para idosos como na sua valência de cuidados continuados –, prestando ainda serviços à população por intermédio de uma centro de fisioterapia privado em Ponta Delgada e exercendo ainda a sua actividade num consultório privado.
Descoberta a sua vocação, este fisioterapeuta decidiu voltar para os Açores em 2010, tendo em conta a situação de crise económica que o país então atravessava, e dado que em solo continental “não existiam muitas ofertas de emprego disponíveis, e as que havia eram precárias”. Em simultâneo, Luís Duarte percebeu que “havia ainda algum mercado a nível regional” devido a “alguma carência de fisioterapeutas”.
Começou, precisamente, por ser fisioterapeuta no Clube Operário Desportivo, na Lagoa, passando depois pela Clínica do Bom Jesus, ao mesmo tempo que procurava investir na sua formação académica, e foi nesse aspecto que sentiu as primeiras “barreiras” impostas ao seu desenvolvimento profissional, devido à distância geográfica em relação às universidades com formação disponível na sua área.
Por esse motivo, acredita que os fisioterapeutas açorianos “não estão no mesmo pé de igualdade em relação aos portugueses que vivem no continente”, tendo em conta que a maior parte das formações decorrem lá e que apenas “pontualmente” são realizadas nos Açores, permitindo o acesso a um maior número de profissionais desta área. Entretanto, nos últimos dez anos, adianta que tem existido “um incremento da oferta formativa na área da fisioterapia, embora continuemos aquém da oferta formativa do continente”.
Num tom positivo, destaca a constituição da Ordem dos Fisioterapeutas, em 2021, que após consecutivos entraves colocados ao longo de duas décadas, foi aprovada pela Assembleia da República e devidamente legislada em 2019, não tendo, por enquanto, nenhuma delegação nos Açores, mas sim um bastonário responsável por todo o território nacional.
Apesar de considerar que, devido à constituição de uma Ordem, esta acaba por ser uma profissão “ainda em construção, quer nos seus estatutos, quer na valorização da carreira”, acaba por, em simultâneo, dar mais valor à profissão e “assegurar a qualidade da fisioterapia para salvaguardar os cidadãos e regular toda a prática da fisioterapia”.
No caso especial dos Açores, considera que existe ainda “muito mercado para o fisioterapeuta intervir”, uma vez que, acrescenta, “tem havido mais oferta laboral do que propriamente procura interna”, registando-se actualmente um “fluxo migratório de fisioterapeutas do continente para reforçar a Região”, dado que a necessidade de “contratar fisioterapeutas tem sido superior aos açorianos que têm regressado à terra” depois de se formarem na área.
No que diz respeito ao modelo de convenções que existe entre o Estado e as entidades privadas, o fisioterapeuta considera que este “necessitaria de uma reestruturação e de uma adequação às reais necessidades da Região”, uma vez que, no modelo actual, “quem necessita de fisioterapia tem que recorrer ao médico de família que o encaminha, ou não, para o fisiatra e só aí inicia os tratamentos de fisioterapia”, o que pode tornar-se demorado em muitos casos.
Fruto deste compasso de espera por vezes demorado do Serviço Regional de Saúde, que poderia ser atenuado também com a contratação de mais profissionais, conta Luís Duarte, existem cada vez mais açorianos – sobretudo aqueles com capacidade económica – que recorrem ao fisioterapeuta de forma directa, sem ingressar no modelo de indicação de cuidados que ocorre através do médico de família, por exemplo, sendo este “um acesso legal que é possível em Portugal, através do sector privado”.
Desta forma, as pessoas optam por fazer os tratamentos de que necessitam por conta própria e junto de um profissional devidamente qualificado: “Alguns utentes já tiveram que esperar muito para terem acesso aos tratamentos de fisioterapia através do sistema público e, como sabem como alguns dos tratamentos têm um número de sessões muito reduzido para atingir a sua melhoria, preferem pagar do seu bolso os tratamentos de fisioterapia”, explica o fisioterapeuta, salientando que também “em situações crónicas que necessitam de poucas intervenções de manutenção ao longo do ano” existem também clientes que procuram os serviços de fisioterapia de forma directa.
Apesar de considerar que as pessoas não se afastam dos tratamentos que sabem que necessitam de receber, acontece, porém, que há situações clínicas com um tempo certo para que seja feita a correcta intervenção, e quando esse tempo é ultrapassado largamente a recuperação ou a minimização dos sintomas torna-se, também, mais difícil.
Neste sentido, Luís Duarte encontra-se, neste momento, a aguardar a aprovação da Comissão de Ética e Saúde do Hospital do Divino Espírito Santo, uma vez que tem o objectivo de realizar um ensaio clínico na Região, debruçando-se sobre o acesso directo à fisioterapia nos cuidados de saúde primários. A ser aprovado, pretende executar o ensaio clínico com vista à sua publicação numa revista científica.
Outro dos problemas que a profissão enfrenta, conta o fisioterapeuta, dá-se devido à existência de concorrência desleal, levada a cabo por pessoas que prestam serviços de fisioterapia ou de reabilitação sem, para os devidos efeitos, terem a formação adequada.
“Sou um defensor da fisioterapia e sou contra a prática ilícita que vemos aqui na Região, nas várias ilhas, e em São Miguel sabemos que há imensas pessoas a realizarem tratamentos de fisioterapia e de reabilitação sem terem as qualificações necessárias para essa prática. (…) Quando essas pessoas exercem a sua prática, tudo bem, mas quando extrapolam as suas competências e começam a fazer tratamentos de fisioterapia e de reabilitação aí é crime e usurpação de funções”, adianta.
Para que estas sejam situações menos recorrentes, Luís Duarte adianta que tem que haver “mais denúncias da parte da população, ou mesmo de profissionais quando têm conhecimento destas situações”, realçando também, a partir das denúncias, o importante papel que cabe à Inspecção Regional da Saúde. Por outro lado, com a constituição de uma Ordem dos Fisioterapeutas, a esperança de alguns destes profissionais é que esta possa “tomar as rédeas desta situação”, de modo a que as inspecções sejam reforçadas neste domínio por intermédio das denúncias.