Duarte Monteiro da Silva vai ao Ártico depois da Antártica

Jovem açoriano tem uma empresa de aluguer de barcos em Ponta Delgada e defende a construção de ancoradouros ao longo da costa

 Os pais queriam que fosse engenheiro ou gestor hoteleiro, mas tiveram de mudar de opinião.  Foram precisos dois anos para perceberam que Duarte queria mesmo era a náutica. “Antes de ir para engenharia já queria ir para Inglaterra fazer um curso com as especificações que pretendia para começar a trabalhar na indústria náutica. Os meus pais resistiram durante dois anos e depois perceberam que a minha paixão era o mar e hoje em dia estão muito contentes com a minha opção”, afirma.
Como todas as crianças, começou no Clube Naval de Ponta Delgada, “que é uma segunda casa para mim e acabou por ser a minha escola profissional e de vida. Passava os meus dias no Clube Naval”. O seu percurso começou na iniciação à vela, na classe Optimist, passou todas as outras fases de iniciação e fez muita competição até aos 19 anos. E, ao longo deste percurso, ele e os colegas obtiveram sempre bons resultados a nível nacional, no europeu e a nível mundial. A amizade no mundo da náutica é uma constante e a forma afável de Duarte ajuda muito. Através de outro colega que já tinha dado a volta ao mundo à vela, “com o senhor António Mota”, recebeu o convite  para ir fazer o curso a Inglaterra. Estava já na universidade e ele disse-me: “Duarte tenho a solução para ti, tens de vir para esta escola, vais fazer o curso e vais confirmar que é isto que vais gostar de fazer. Acabei por ir para a escola em 2005 e, em 2006, fui para Palma de Maiorca, que é uma dos maiores centros da náutica do Mediterrâneo. Comecei a trabalhar, primeiro, no Mediterrâneo. Através de um proprietário alemão fui parar ao Pacífico. Estive três anos a trabalhar entre a Costa Rica e a Nova Zelândia. Fazíamos a ilhas Galápagos, Polinésia francesa, Samoa e Fiji”.
“Depois”, prosseguiu, “voltei à Europa para estar um pouco próximo da família. Realmente, o Pacífico tem isto: por vezes, são 24 horas de viagem e era um pouco longe. E, então, voltei e comecei a fazer um pouco a Europa e Caraíbas. E, aqui nos Açores, eu e o meu sócio Castanheiro criámos a empresa Pure Sail. Mas é-me difícil desligar da navegação nos barcos grandes onde a tecnologia está sempre a mudar. Vão surgindo projectos interessantes como a viagem à Antártica e, agora, a viagem ao Ártico e procura estar na vanguarda”, afirma.

Após a Antárctica, vai ao Ártico. Como vai ser?
Duarte Monteiro da Silva – Pela beleza com que nos deparamos na viagem à Antártica, ficou-nos a vontade ainda maior de atravessar o Ártico. Só que a logística vai ser diferente. Será numa outra altura do ano. Havia a hipótese de fazer esta nova viagem já este ano. (…)
Estive até ao mês passado na Carolina do Sul. Estava lá à espera de indicações para começar a subir a costa dos Estados Unidos, íamos até ao Estado do Maine e, depois, passar pela Nova Escócia, Terra Nova e, talvez, navegar até à Gronelândia. Surgiram algumas dificuldades e há um mês atrás decidimos trazer o barco para a Europa. Cheguei esta semana ao Faial e vim ver a minha família a São Miguel.
Agora, voltamos a colocar novamente a hipótese de irmos no próximo ano ao Árctico. Quando isto acontecer, começamos no Canadá, Terra Nova e, depois, durante o Verão, com as alterações climáticas, há uma zona de degelo que surge nesta altura no Ártico. Mas é uma janela muito pequena de dois meses. Normalmente, é um barco de quebra-gelo do Canadá que vai à frente, ao longo da passagem, a ver se há condições. No caso de haver condições, eles abrem a passagem e fica aberta para qualquer navegador passar. No caso de o Governo do Canadá não abrir a passagem oficialmente, se houver algum pedido de socorro, a pessoa está por sua conta. Já se a passagem for aberta oficialmente por existirem condições de passagem, os meios de salvamento do governo canadiano vão lá e prestam socorro às tripulações.
Normalmente, vão os quebra-gelo. Depois, vão os navios de cruzeiro que já começam a fazer esta viagem e, depois, vão os barcos mais pequenos privados. Vamos pelo Estado de Main, Nova Escócia, Terra Nova e depois começa o Alasca e o barco sai do lado do Pacífico. É uma viagem para fazer no mês de Agosto e Setembro. A passagem faz-se num mês. Há uma pequena vila de esquimós que fica lá no centro que prestam auxílio aos navegadores. Nesta altura têm lá forma de as embarcações abastecerem de gasóleo. Nós somos um barco à vela, mas numa passagem daquelas, por vezes, é necessário o auxílio do motor. Temos gasóleo suficiente para fazer uma viagem destas, mas para barcos mais pequenos de 12 a 15 metros, não têm esta autonomia e então existe uma vila a meio da passagem em que os esquimós auxiliam quem precisa.
Na viagem, saímos no Norte do Alasca, descemos a encosta do Canadá e dos Estados Unidos até ao estreito do Panamá de passagem para o Atlântico.

Vai surgir um novo barco para irem ao Ártico?
O proprietário do barco, de origem argentina, tem a ideia de construir um barco novo, mais sustentável, com motores eléctricos. A tecnologia dos motores já existe e está sempre a desenvolver-se. Estes motores são movidos a painéis solares e também a própria hélice funciona como um gerador. Nós começamos a mover à vela a partir dos cinco nós. O movimento da hélice funciona como um gerador que acaba por carregar o banco de baterias de energia armazenada para, depois, servirá para fazermos funcionar o motor eléctrico. E também temos energia eólica. Além dos painéis solares, também existem duas ventoinhas que são instaladas na popa do barco. Portanto, temos  três formas de poder encher o banco de baterias e energia.
Os barcos da empresa 360 Sol, que tem as energias alternativas como , são baseados na teoria de Darwin. Por isso é que o primeiro se chamou ‘NDS Darwin’, o segundo é o ‘NDS Evolution’ – que está na Horta - e o próximo será ‘EDS Zero’, que tem muito a ver com a energia verde.
Está já decidido que o ‘NDS Evolution’ estará cerca de um mês e meio a visitar as ilhas dos Açores. O seu proprietário vai regressar, de avião,  à Região para fazer esta viagem.
Os Açores sempre foram muito conhecidos no mundo dos barcos pela sua posição geográfica. Quando acaba a temporada das Caraíbas, os barcos, quando regressam à Europa, têm os Açores quase como paragem obrigatória para abastecerem de combustíveis e mantimentos, fazer reparações e descansar.  
 Vou mostrar as nossas nove ilhas e sinto que há cada vez maior apetência por quem demanda os Açores em conhecer todas as ilhas. Já não vêm só para um ponto de paragem. Agora muitos dos velejadores vêm e ficam. Por vezes, vêm das Caraíbas, acabam por ficar aqui um mês, dois meses. E nós já começamos a ter boas estruturas, bons estaleiros. A marina de Santa Maria já tem uma boa invernagem para os barcos. Decidem deixar o barco aqui dois meses, voltam a suas casas e regressam cá antes de voltarem a velejar para o continente europeu. Esta é uma realidade que devíamos aproveitar ao máximo. Eles deixam muito dinheiro na Região. Quando o barco está aqui, há sempre reparações a fazer e compras para efectuar. A Região deveria investir mais na área da náutica para as ilhas se tornarem mais acessíveis a estas embarcações. Já começamos a ter boas estruturas na Região. Começamos a ter cada vez mais bons profissionais, temos marinas em quase todas as ilhas. Praticamente só o Corvo não tem. E já se chegou à conclusão que, por vezes, as marinas são pequenas demais para os barcos que existem durante o Verão.
Uma das minhas sugestões e um dos projectos que gostaria de ver acontecer seria a criação de pontos de ancoradouro. Nos Açores existem poucos ancoradouros de areia. E como não existem muitos ancoradouros naturais, era preciso criar ancoradouros com bóias ao longo da costa das ilhas. Podia começar a criar um projecto piloto numa ilha. Vê-se como é que as embarcações iriam reagir e, depois, transferir este projecto para outras ilhas porque isto poderia criar uma situação nova. Os barcos em vez de ficarem só parados nas marinas, começariam a espalhar-se à volta da ilha. Normalmente, precisamos de uma marinha quando chegamos e quando deixamos o arquipélago. E é muito mais interessante e mais bonito estar ancorado numa baía, ver a natureza e explorar a costa. E ao acontecer isto, as pessoas poderão ir ao final do dia a terra jantar num restaurante que exista na baía. Os iatistas acabam, a partir dos ancoradouros, explorar a  riqueza ao longo das baías. Toda a gente tinha a ganhar com esta solução.

A Antárctica já passou à história’
Não, muitas vezes ponho-me a ver filmagens. Temos um pequeno documentário de 50 minutos patrocinado por uma fundação francesa e a  Príncipe de Mónaco. E uma das razões principais foi passar o documentário nas escolas francesas para os miúdos ganharem um bocado a noção sobre o que é a Antártica e da sua importância. E todas as vezes que vejo o comentário, adorava lá voltar. Espero que, num dos próximos anos, apareça um outro projecto para ir lá.

Vai seguir de perto a construção do novo barco para o a missão Árctico?
Uma das hipóteses é ser contratado pelo proprietário para acompanhar, como se fosse um fiscal da construção, para defender os interesses do proprietário. É uma coisa que gostaria de fazer. É interessante ver o barco surgir adequado às necessidades dos sítios que pretendemos visitar.

Entretanto, tem uma empresa em São Miguel…
A nossa empresa, em Ponta Delgada, continua a ter muita procura. Os Açores estão muito na moda e isso é muito bom. As pessoas querem ouvir falar mais dos Açores como destino de vela não tanto para as pessoas que já navegam porque todas elas conhecem as Região, mas para as pessoas que gostam de alugar barcos, como na Grécia, nas Caraíbas e na Croácia.
E os Açores começam, cada vez mais, a ser mais falados neste mercado. Sofremos com a guerra porque tínhamos muitos bielorrussos, russos e ucranianos. Mas foram surgindo alugueres em cima da hora e conseguimos ter um ano aceitável. Tínhamos quatro barcos, agora passamos a três com a ideia de, apara o ano, adquirir outras duas embarcações um pouco maiores. Os nossos pedidos têm passado muito por barcos de quatro cabines e, neste momento, temos barcos de três cabines.
O aluguer mais procurado é de uma semana, mas também temos muitos alugueres de duas semanas. Normalmente, a pessoa que queira fazer os Açores a partir da nossa base em Ponta Delgada e ir ao grupo central do arquipélago, dizemos que o mínimo deverá ser sempre as duas semanas. Para uma semana aconselhamos a pessoa a fazer só São Miguel e Santa Maria. Temos também a marina nova na Povoação, além da marina na Vila Franca e isto tem ajudado imenso. É fácil fazer um roteiro de uma semana. A pessoa pode sair de Ponta Delgada, ir a Vila Franca, Povoação e, depois, fazer a viagem para Santa Maria que é das melhores ilhas para operar. Tem São Lourenço e a Praia Formosa e pode ter sempre a hipótese de ir à marina de Vila do Porto. E, depois, regressa a Ponta Delgada. Este é um percurso muito bom para uma semana.  E este é um negócio que, acredito, vai crescer muito nos Açores.
                                           

 

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Autor: João Paz

Categorias: Regional

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