Gualter Pereira, produtor agrícola da Ribeira Seca

“A falta de mão-de-obra é um dos maiores problemas” da agricultura açoriana

O nosso encontro com Gualter Pereira já estava a ser planeado há alguns dias, mas o grande volume de trabalho e a necessidade de acudir às encomendas nesta época do ano fizeram com que só fosse possível conversarmos ao início da tarde ontem. À chegada à Ribeira Seca, na Ribeira Grande, encontramos este produtor de 35 anos a proceder à lavagem de batatas que seguirão, durante o dia de hoje, para algumas das grandes superfícies na ilha de São Miguel. O trabalho por aqui nunca abranda, vai-nos contando enquanto nos dirigimos para os seus terrenos agrícolas.
Com aproximadamente 4 hectares actualmente em produção, Gualter Pereira, que ingressou a tempo inteiro na vida da agricultura há 8 anos, admite que até já teve uma área de produção maior.
“Houve uma altura que fazia mais terra, mas com a falta de mão-de-obra, tive de reduzir um pouco, em cerca de 1.2 hectares”, lamenta.
Mas antes de abordarmos aquela que é presentemente a sua maior preocupação, Gualter Pereira explica a opção tomada por diversificar a sua produção.
“Produzo várias coisas porque o nosso mercado é um pouco restrito, não na questão das quantidades porque os pedidos até têm vindo a aumentar com o turismo, mas não me posso dedicar a um, dois ou três artigos apenas porque se fizer, por exemplo, tudo em batata ou melancia, será muita quantidade para escoar. Por isso, faço quatro qualidades de couve (lombarda, coração, branca e portuguesa); melancia; meloa; pepino, só no início e numa altura em que há mais procura; faço curgete do princípio ao fim da campanha que começa mais ou menos em Março e vai até Agosto ou Setembro”, realça antes de voltar a focar a sua atenção na falta de mão-de-obra crónica com que se depara.
“Tinha mais área para estender, mas não é possível porque não há mão-de-obra (…) É um dos maiores problemas” do sector, reforça este agricultor.
Gualter Pereira destaca, numa outra vertente, a dedicação necessária para se desenvolver esta actividade.
“A gente é que apanha, faz a logística e somos nós que produzimos. A parte da organização de documentos para a contabilidade é feita à noite depois do dia de trabalho que começa às 5 da manhã e acaba às 19h ou às 20h”, refere, antes de dizer que “se não gostasse, ninguém consegue aguentar”.
Apesar da ‘dureza’, este agricultor responde categoricamente garantindo que “não trocaria de vida”.
“Fui criado nisto desde pequenino e, no outro trabalho que tive, não via nada a crescer enquanto aqui dá um certo gozo (embora não façamos isto por divertimento) colocar uma semente na terra, vê-la a crescer, tratar dela e depois ter este resultado final”, afirma apontando para uma grande melancia.
Ainda sobre a melancia, Gualter Pereira revela que, “só este ano, já devo ter vendido à volta de 17 toneladas e este nem foi dos melhores anos para a melancia (…) Foi o ano em que vendi mais porque reduzi outras áreas por causa da mão-de-obra, como por exemplo, na meloa que é algo que temos de ‘correr’ todos os dias. Com a curgete passa-se a mesma coisa e já tenho algumas que se não forem apanhados hoje, amanhã já não passam nos calibres para serem vendidas nas grandes superfícies”.
Este agricultor afirma que tem nos hipermercados os seus grandes compradores e só, “quando tenho um pouco a mais, vendo para a Lider Frutas ou para a Frutaria São Miguel. Há uns anos atrás, quando comecei, vendia para alguns supermercados, mas deixei de o fazer porque não tinha tempo para tudo. As encomendas começam a surgir durante o dia e chegamos a um ponto em que não conseguimos produzir porque temos de estar sempre a distribuir”.
Quando questionado sobre a existência de dificuldades no acesso à água para regadio, Gualter Pereira atira que “muitas vezes as pessoas queixam-se, mas não fazem nada por isso”.
“Há 8 anos gastei quase 5.000 euros e tenho uma torneira neste terreno de 15 em 15 metros porque puxei água desde o caminho. Foi um investimento, não tive qualquer apoio e foi uma opção minha porque senão não podia ter repolhos durante o Verão”, aponta.
Para além disso, este agricultor revela que também já realizou um outro investimento em que instalou “uma série de tubos gota a gota que também não são nada baratos. Tenho tudo o que é preciso para produzir e agora, o que era mais simples há uns anos atrás, a mão-de-obra, não a tenho”, lamenta.
Este problema é também um dos motivos, segundo conta, para não apostar no cultivo de uma maior quantidade de novos produtos.
“Um ano até cheguei a fazer brócolo roxo e vamos conversando com as pessoas do hiper que nos vão dizendo e indicando que podíamos fazer isto ou aquilo (…) Também tive cenoura e todos os anos fazia 3 ou 4 alqueires de cebola e este ano nem cheguei a fazer um porque ficamos limitados sem mão-de-obra. Vem na mesma época da melancia e se não tiver quem corte na altura certa não dá resultado. Temos vindo a reduzir para não deitar dinheiro para a água”, lamenta.                 

 

Print

Categorias: Regional

Tags:

x