(Correio dos Açores) No que diz respeito ao Grupo Ilha Verde, nomeadamente na parte do aluguer de viaturas, como começou o ano de 2020?
(Luís Rego, Grupo Ilha Verde) O ano de 2020 estava a começar relativamente bem, ao ritmo normal que tem vindo a decorrer nos últimos anos, ou seja, num ritmo de crescimento, e perspectivava-se que o ano passado seria um ano que iria acompanhar a evolução dos anos anteriores, apesar de notarmos que de Janeiro a Março houve algum decréscimo. A partir de Abril, quando se começa a acentuar um maior movimento e quando se dá início às operações dos diversos países, os indicadores eram positivos e apontavam para que continuássemos a crescer como nos anos anteriores.
Sente que no início de 2020 havia mais movimento na sua actividade quando em comparação com o início de 2019?
(…) Os indicadores que tínhamos dos últimos meses de 2019 e do início de 2020, até Março, demonstram que a nossa actividade registava algum decréscimo. Neste decréscimo podemos, sem dúvida, ter em conta a tipologia do turista que nos visita, mas também há outro factor que é preciso ter em conta, que é o excesso de oferta que os Açores têm tido nos últimos anos com o surgimento de várias empresas que nos últimos anos se instalaram na Região.
No contexto desta crise, acredita que algumas destas empresas – nomeadamente as mais recentes – podem acabar por fechar portas?
(…) Neste caso em concreto e no sector do turismo, o mais atingido, é natural que possa acontecer, porque a crise está-se a prolongar mais do que aquilo que era inicialmente previsto.
Apelou-se à maior parte das empresas e empresários para manterem a sua estrutura, os seus quadros e os seus colaboradores, o que faria todo o sentido, e por isso adiantaram alguns apoios para que as empresas pudessem cumprir com o que foi solicitado, mas claro que as dificuldades, mesmo com estes apoios, são enormes, pelo que não é de todo impossível alguma poder não continuar a sua actividade no futuro.
A crise é tão profunda e as dificuldades são tão grandes que é muito natural que isto aconteça, independentemente da dimensão das empresas, grandes ou pequenas. Basta ver o que aconteceu no início da pandemia nos Estados Unidos, com uma das maiores empresas a nível mundial, e o que está a acontecer na Europa com as maiores empresas de aluguer de automóveis que têm vindo a ser capitalizadas e a ter apoios de grandes montantes e que continuam a solicitar aos governos de cada país suportes financeiros para continuarem a manter a sua actividade.
Pode-se afirmar que 2020, para nós e para a actividade de aluguer de automóveis, foi um dos piores anos de sempre desde o início da actividade, inclusive para nós, que iniciámos em 1971.
No caso do Grupo Ilha Verde, aderiram a algum tipo de apoio para atenuar os efeitos da pandemia na economia?
Sim, a todos os mecanismos que foram postos à disposição e para os quais nós reunimos as condições necessárias. Candidatámo-nos a todos os apoios porque de outra forma era impossível continuarmos a sobreviver, mesmo se esses apoios que não são suficientes para mantermos a nossa actividade.
O custo das operações é muito superior à nossa facturação, consequentemente muito superiores aos apoios que nos temos vindo a candidatar e que temos vindo a receber, que estão a ser muito importantes e que precisarão no futuro e no presente de um reforço para continuarmos a manter a nossa actividade.
Há quem defenda que os empréstimos que foram concedidos às empresas devem ser transformados em fundo perdido. Concorda?
Sim, perfeitamente. Nós não precisaríamos de apoios se conseguíssemos manter o fluxo que tínhamos na nossa facturação e conseguíssemos manter os clientes que era previsível termos.
Sem receita e sem facturação é impossível manter qualquer estrutura. Esses apoios que servem para minimizar este impacto seria importantíssimo se fossem transformados em fundo perdido – alguns já foram. Seria extremamente importante sob pena de ajudar a recapitalizar as empresas de forma a contribuir para manter a sua actividade e manter o tecido económico aqui na Região. Importante é também manter a nossa capacidade de oferta para rapidamente podermos crescer, o que seria uma ajuda extremamente importante para a nossa economia.
Qual tem sido o valor da quebra registado no sector do aluguer de viaturas?
Nos Açores, tendo em conta a nossa actividade quando em comparação com a actividade a nível nacional, a nossa quebra é muito superior. Enquanto a actividade de rent-a-car a nível nacional tem uma quebra de 50%, a nossa quebra aqui é superior a 80%.
A média do ano de 2020 esteve na casa dos 80%, o que indica que a nossa dificuldade na actividade turística no âmbito das rent-a-car. Por isso justificar-se-ia nos Açores, e como tem vindo em parte a acontecer, um maior apoio às empresas de uma forma geral.
Em todas as crises que passaram pelos Açores, dada a nossa dimensão e a nossa pequenez, a nossa sazonalidade, as crises são mais profundas (…), por isso exige-se, de alguma forma, e seria importante que este factor fosse levado em consideração, um reforço de apoios quer a fundo perdido, quer noutra dimensão, como a recapitalização das empresas com possível devolução ou não, com apoios ao lay-off, etc.
A recuperação do turismo dar-se-á em breve?
Acredito que depois de uma tempestade vem sempre a bonança e que depois de uma crise vem sempre a recuperação. Estou convencido que os Açores irão retomar e recuperar, embora de uma maneira diferente, o turismo na Região. A comunicação está a ser mais alinhada para a sustentabilidade e para a natureza, que é onde nós nos inserimos, e penso que cada vez mais haverá mais espaços para este tipo de turismo, que é mais activo e ecológico.
Mas isso não depende só de nós, é importante que os outros mercados que sustentam a nossa actividade turística na Região também estejam bem e que estejam em franca recuperação para também nós podermos recuperar. Estou optimista em relação a este aspecto, mas será uma recuperação mais lenta do que aquilo que nos é dado neste momento a perceber.
Também no tempo esta recuperação será mais tardia do que aquilo que inicialmente se estava a prever. É necessário que sejamos todos optimistas, mas conscientes das dificuldades que nos esperam. Quando inicialmente pensaríamos que três ou quatro anos seriam suficientes para recuperar a economia, o turismo e a nossa actividade de uma forma geral, creio que vamos precisar de entre oito a dez anos, sem ser muito pessimista, para recuperar e atingir níveis iguais ou superiores àqueles que estávamos habituados no passado. Mas esperemos bem que com a vacina as coisas possam vir a recuperar.
2021 será então a continuação de 2020, um ano de incertezas?
Inicialmente apontaria que à medida que fôssemos entrando em 2021 íamos recuperando. Neste momento não temos a certeza, mas aquilo que nos aponta o primeiro semestre é que será muito idêntico àquilo que estamos a ver hoje, e supomos que antes de Março não existam grandes alterações.
A partir daí, com a vacinação, com certeza que haverá alguma evolução e alguma luz ao fundo do túnel, e naturalmente que a partir de Junho e Julho se irá sentir alguma recuperação. Mas está tudo muito incerto. Há clientes nossos que apontavam iniciar as suas operações nos Açores a partir de Abril e hoje já estão a pensar, embora na incerteza, avançar a partir de Julho. Apontam para uma operação muito curta. (…) A única certeza é que pensávamos que iria existir retoma já no início de 2021 e ela não está a existir.
Manter a empregabilidade será um desafio para este ano?
A nossa preocupação foi manter o emprego até ao final do ano em toda a nossa estrutura. Iremos procurar mantê-la se assim conseguirmos, se continuarmos a ter os apoios programados bem como o apoio à retoma que o Governo a nível nacional e a nível regional estão a equacionar. A nossa intenção é, sem dúvida, continuar a manter as nossas estruturas de forma a que quando a retoma se iniciar estarmos prontos a responder da melhor forma, mas não está a ser fácil.
Neste aspecto tem havido alguma dificuldade?
Uma das nossas maiores dificuldades na Associação dos Industriais de Aluguer de Automóveis sem condutor (ARAC) é tratar destes assuntos junto do Governo e do Ministério da Economia para criar uma extensão à lei do lay-off na qual nós e todas as empresas do sector têm vindo a candidatar-se e a receber apoios, mas algumas empresas têm tido alguma dificuldade e impossibilidade de se candidatar, e apesar de terem quebras superiores a 75%, não têm conseguido obter o lay-off.
Aqui, a nossa actividade é duplamente penalizada porque é preciso encontrar uma excepção na lei, na medida em que a nossa actividade se assume exclusivamente no aluguer de viaturas e de serviços.
(…) O que é levado em consideração para determinar a percentagem de quebra e de apoio que se consegue obter o lay-off tem a ver com o volume de facturação, mas no nosso caso temos as facturas do serviço de aluguer e da venda de viaturas, porque todos os anos fazemos a renovação da nossa frota, o que é considerado como fazendo parte da facturação total da empresa, o que não deveria ser.
(…) Não estávamos a contar com isso, e muitas empresas estão impedidas de aceder ao lay-off por esta via. Estamos a aguardar que se consiga atender e perceber esta nossa “aflição”, no sentido de alterar e de se criar aqui uma excepção à regra.